Você já customizou um nome de jogador na chuteira da Nike? O nome vem impresso, fazendo parte do produto, por menos de R$ 10. Já de maneira mais radical, a Adidas começou a oferecer em 2019 um tênis com solado 100% adaptado ao formato dos pés dos clientes, por meio de tecnologia de impressora 3D à base de carbono. Muitos estão olhando para a customização em massa viabilizada pela tecnologia e vendo os produtos que podem fazer. Nós estamos olhando para a customização em massa e pensando em que tipo de liderança será necessário para as empresas aproveitarem essas novas oportunidades, garantindo a produtividade.

Nesse novo cenário, acreditamos no conceito que chamamos de “liderança coevolutiva” – a liderança que resgata valores do passado e evolui em conjunto não só com o avanço tecnológico, como a customização em massa, mas, principalmente, com o novo tipo de colaborador das organizações. Para conseguir o feito, tal liderança tem de ser composta por três dimensões: visão, convicção e motivação.

Na liderança coevolutiva, a visão oferece a direção a ser seguida, a convicção faz os colaboradores se unirem e se movimentarem em busca do que foi planejado, e a motivação representa dois aspectos – ajuda o colaborador com as dificuldades enfrentadas e não os atrapalha, o que significa determinar a velocidade e o ritmo de execução.

Visão compartilhada

Mais do que nunca, olhar para o futuro se torna uma atividade crítica para a sobrevivência do negócio. O futuro tem de ir sendo construído paulatinamente, à medida que novas tecnologias vão surgindo e novos concorrentes vão desembarcando em seu mercado. Com isso, será necessário organizar de forma “meio que frouxa”, uma tradução livre de Karl Weick, os integrantes da organização. Esse tipo de organização se caracteriza por ser mais flexível e mais adaptável às mudanças do que uma organização rigidamente organizada, tal como a estrutura militar ou a de muitas organizações religiosas, por exemplo. Só que organizações meio que frouxamente apertadas devem buscar a produtividade necessária, por meio de eficiência, sinergia e velocidade.

A visão não pode, na liderança coevolutiva, estar restrita à mente de poucas pessoas na organização; deve ser corretamente compartilhada ou nunca será realizada. A visão compartilhada demonstra para todos o que queremos criar em nosso trabalho e, assim, libera a energia e a coragem das pessoas, funcionando como uma faísca que acende a chama interior de cada um, para usar as palavras de Peter Senge.

E quando você pode dizer que uma visão está realmente compartilhada em sua empresa? Quando as pessoas começam a ter a mesma imagem em mente ao pensar no futuro de sua organização e desejam trabalhar duro para que ela se confirme. Assim, a produtividade nos novos tempos só é possível se a liderança proporcionar uma visão compartilhada.

Como o líder pode fazer isso? Citando Jim Collins, tendo as pessoas certas no barco (o que inclui saber contratá-las, dar-lhes autonomia e responsabilidade, desenvolvê-las constantemente). Também deve-se estimular que cada um tenha uma visão e fazer com que esta se conjugue com a visão organizacional compartilhada. Por fim, deve-se demonstrar os benefícios de alcançar a visão compartilhada.

Compartilhar a visão não é apenas um exercício técnico, que fique claro. Significa exercer a liderança em seu patamar mais profundo, que é o de tirar as pessoas de sua zona de conforto e conduzi-las em direção ao crescimento, para que desenvolvam primeiro suas próprias visões e depois conjuguem-nas numa visão agregada. Sem uma preocupação de agregar as diferentes visões, um líder não conseguirá realizar a mudança estratégica significativa que os tempos tecnológicos pedem – e não conseguirá obter produtividade, portanto.

Convicção

Convicção não significa rigidez, tampouco teimosia. Por convicção pode-se entender o poder do líder de unir seus colaboradores em torno de uma causa – a visão, nesse caso. É possível uni-los, por exemplo, por meio de uma história que faça com que aquilo tenha sentido e justifique as ações. A partir do momento em que algo faz sentido, o colaborador “compra” a ideia e altera o seu comportamento para ser útil. A convicção é uma espécie de conceito guarda-chuva que o líder opera por meio da comunicação, e também de seu magnetismo pessoal e caráter.

A comunicação representa a forma como o líder vai escutar e tranquilizar seus colaboradores em relação ao assunto, e apresenta um forte elemento relacional – se for horizontalmente construída, fornecerá uma espécie de conversa entre amigos. O magnetismo pessoal ou animal, assunto estudado pelo médico alemão Franz Mesmer no século 18, representa a energia que amplia ou anula a reciprocidade, a simpatia e a afinidade que pode existir entre as pessoas, um componente da liderança que conecta a força vital (do corpo físico-biológico) do líder com o inconsciente das outras pessoas [veja quadro nesta página].

O caráter é o terceiro elemento da convicção e se refere aos valores do indivíduo. Pessoas com bom caráter e com quem convivemos no dia a dia nos passam confiança. Os valores não precisam ser ditos, mas vivenciados. O caráter tem a ver com aquilo que nós somos. Está relacionado à integridade, maturidade e mentalidade de abundância.

A integridade tem a ver com coerência, com ser correto em todas as esferas de sua vida. Conta-se que um casal passou no drive-thru de um restaurante fast-food para comprar um lanche e, ao pegar seu pacote, percebeu que havia dinheiro colocado por engano ali. Os dois devolveram o dinheiro, mas recusaram-se a tirar uma foto como os funcionários propuseram para homenageá-los, pois viviam uma relação extra-conjugal. Eles eram honestos, mas não em tudo; então, faltava integridade. A maturidade é desenvolvida quando a pessoa aprende a lidar consigo mesma, deixando de depender do ambiente e agindo conforme suas escolhas – isso permite que seja corajosa e bondosa, e que possa lidar de maneira compassiva com as questões difíceis da vida, como afirmou Stephen Covey. Já a mentalidade da abundância elimina as premissas de competitividade e escassez e, citando Covey novamente, o indivíduo que a possui procura soluções que atendam igualmente as partes envolvidas.

Motivação

Motivar os outros é complexo, mas não é algo impossível, como dizem alguns. Todos nós sabemos que, mesmo com a quarta revolução industrial, o ser humano vai gostar daquele que apoiá-lo e o fizer crescer, inclusive nas adversidades. O líder da coevolução representa esse líder que joga o jogo do win-win.

A motivação pode ser tratada pelo líder com três itens: recompensas, feedback e o desenvolvimento pessoal percebido pelo colaborador. De recompensas, não pensamos apenas em remuneração financeira fixa (salários) e variável (bônus e participação nos lucros e resultados), mas principalmente nas não financeiras. Uma palavra amiga, um apoio quando o colaborador estiver passando por dificuldades familiares, um tempo usado para escutar o desabafo, um presente ou lembrancinha de viagem, uma comemoração no restaurante para a equipe após o término de um projeto etc. Toda pessoa que quer se manter como líder precisa enfiar uma mão no bolso e manter a outra na consciência, dedicando tempo e energia, esforço e consideração para recompensar seus colaboradores.

Quanto ao feedback, é necessário realizá-lo de modo contínuo e adequado. Feedback não é descontar no trabalhador sua insatisfação enquanto gestor de resultados; o feedback adequado é aquele justo e edificante.

Por último, e não menos importante, vem o desenvolvimento pessoal percebido. Ele é a chave para que o colaborador continue motivado com algo. Quando se percebe que o tempo, a energia e os esforços despendidos estão trazendo frutos e resultados inclusive para o indivíduo (não só para a empresa), então é factível que se continuem os esforços e a produtividade. Empowerment, mais oportunidades, rotação de tarefas, treinamento e viagens são alguns dos frutos que os colaboradores percebem como seus.

Pensando de maneira sistêmica, a motivação acontece por meio da influência que os líderes têm sobre sua equipe. Influência não significa manipulação nesse caso, e sim motivar as pessoas a desejarem por si mesmas alcançar um objetivo. Joseph Grenny, Kerry Patterson e colegas realizaram um importante estudo sobre a arte da influência e concluíram que as pessoas fazem as coisas por duas razões: porque querem ou porque conseguem. E essas duas razões podem ser impulsionadas por três esferas: pessoal, social e estrutural.

Combinando razões e esferas, chegamos a seis fontes de influência. Um líder influencia um indivíduo quando (1) o objetivo a alcançar está alinhado com a motivação pessoal dele; (2) ele tiver a habilidade requerida para fazer aquilo (ou adquiri-la, por meio de treinamentos); (3) existir pressão dos grupos sociais a que pertence em direção às atividades desejadas; (4) houver pessoas ao seu redor facilitando a execução da tarefa, podendo lhe ensinar a fazer ou dar apoio; (5) o sistema de recompensas e punições estabelecido pelo líder mostra que a atividade desejada é realmente importante; e (6) a estrutura ao redor – sejam ferramentas adequadas, softwares eficazes, lembretes nas paredes etc. – facilita sua ação e o impulsiona.

Estudos apontam que, se utilizadas da maneira correta, essas fontes podem aumentar em até dez vezes a capacidade de influência de um líder.

LIBERTE SEUS COLABORADORES

Não nos iludamos: na sociedade transformada de hoje, o líder e a alta cúpula podem ser entraves à produtividade dos colaboradores e à evolução das empresas.

O momento atual requer uma liderança não baseada na opressão e na hierarquia, mas que mantenha simultaneamente a visão de futuro e o foco na execução presente. Essa é a liderança coevolutiva: liberta os colaboradores da tarefa ingrata de receber ordens e busca seu progresso para que todos juntos construam o futuro.